Volta às aulas presenciais requer atenção à educação inclusiva
8 de setembro de 2020
A educação inclusiva deve ser uma meta para qualquer época, mas nesta volta às aulas presenciais merece especial atenção. Estudantes com deficiência têm o direito de um retorno adequado, como os demais jovens.
É notório que a repentina transformação ocasionada pela pandemia do novo coronavírus (Covid-19) trouxe impactos severos a todos, especialmente às pessoas socialmente mais vulneráveis. Se os passos seguintes não forem planejados considerando a diversidade, pode-se acabar por aprofundar o contexto desigual já existente.
No Brasil, 23,9% da população têm algum tipo de deficiência, segundo o Censo do IBGE de 2010. Ou seja, 45,6 milhões de pessoas, que além da exclusão social, enfrentam sérias questões quando se trata da acessibilidade dos sites e aplicativos. Ferramentas essenciais para o desenvolvimento das aulas remotas e que tendem a permanecer no pós-pandemia.
Educação inclusiva: uma escola para todos
Em julho, o Instituto Rodrigo Mendes publicou um estudo chamado “Protocolos sobre educação inclusiva durante a pandemia da Covid-19 – Um sobrevoo por 23 países e organismos internacionais”. Diante dos impactos gerados pela situação na Educação Básica do Brasil, ele reúne exemplos de diretrizes, protocolos e práticas para ajudar educadores a pensar soluções para a educação inclusiva.
Feito com base em consulta à especialistas do mundo todo e na análise de arquivos de organismos internacionais, como ONU, Unicef, Unesco, OCDE, OMS e Banco Mundial, além de protocolos de governos já elaborados, o documento tem um capítulo especial para a volta às aulas. O objetivo é lembrar que a complexidade deste novo contexto não pode ser usada como justificativa para que estudantes com deficiência sejam privados do acesso à aprendizagem.
Apesar de certos jovens pertencerem a grupos de risco, o laudo médico de deficiência, segundo o arquivo, não deve ser aceito como justificativa para que eles sejam deixados para trás. É importante esclarecer que não existe correlação automática entre deficiência e risco.
Por isso, a decisão sobre o retorno deve ser baseada na análise individual de cada caso. Sempre envolvendo as famílias, que sabem sobre o que funciona melhor e quais as necessidades de cada um. Ao mesmo tempo, deve envolver questões de risco à saúde e o contexto domiciliar. “Em resumo, sempre que possível e seguro, recomenda-se que as crianças e adolescentes com deficiência voltem às aulas juntamente com os demais estudantes” (Protocolos sobre educação inclusiva durante a pandemia da Covid-19, p.32).
Recomendações para a volta às aulas
Um retorno seguro e que fomente a educação inclusiva deve partir do treinamento de todos os discentes, professores e funcionários sobre os protocolos sanitários. Lembrando que os estudantes com deficiência que possuem dificuldades de executar os processos sozinhos, precisarão de amparo para a realização da lavagem e desinfecção correta das mãos.
No caso dos que usam cadeiras de rodas e sempre tocam as rodas delas, deve-se ter especial atenção a lavagem das mãos ou instruir a família a disponibilizar luvas descartáveis. O álcool em gel precisa estar sempre à disposição, com as sinalizações corretas para que todos se lembrem de utilizá-lo.
Quanto ao uso de máscaras, este deve ser observado circunstância a circunstância, pois para alguns jovens, como os com deficiência auditiva, o item prejudica a comunicação e socialização. Uma vez que utilizam a leitura labial ou a Língua Brasileira de Sinais (Libras).
Uma solução é o uso de máscaras transparentes ou a possível flexibilização para esses estudantes, seus professores, intérpretes e colegas de classe, em situações específicas. Claro que sempre mantendo o distanciamento necessário.
Outra situação especial, é o caso de pessoas que tenham os movimentos dos membros superiores reduzidos. Como não conseguem remover a máscara sozinhos, o uso dela não deve ser obrigatório, pois há risco de sufocamento. O mesmo para jovens com Transtorno do Espectro Autista (TEA), que podem apresentar maior dificuldade para tolerar o uso do item.
Atenção ao ensino-aprendizagem
Em relação ao ensino-aprendizagem na educação inclusiva, em uma volta às aulas presenciais, o primeiro aspecto a ser considerado é a produção consistente de dados empíricos. Dessa forma, as decisões e estratégias serão baseadas em dados.
Por isso, é importante que os educadores conheçam como foi a realidade de seus estudantes com deficiência durante o isolamento. Quais atrasos na aprendizagem e demais impactos podem ter os afetado? Para isso, a escola pode realizar avaliações e entrevistas diagnósticas. A partir delas, fortalecer todas as atividades voltadas à educação inclusiva, o que inclui o planejamento, o material didático acessível, a disponibilização de cuidadores, intérpretes e quaisquer outros profissionais de apoio.
As instituições devem manter uma relação próxima com as famílias. Tomando o cuidado de garantir uma transição suave do ensino remoto a volta às aulas presenciais. É imprescindível escolher os principais objetivos de aprendizagem para o ano letivo e ajustar o currículo, adotando abordagens práticas, como a aprendizagem baseada em projetos.
Isto posto, fica mais fácil implementar programas direcionados aos que necessitam de recuperação ou aceleração da aprendizagem, assim como determinar o que avaliar e como avaliar.
É o momento de identificar estratégias e intervenções para lidar com as lacunas de aprendizagem, principalmente entre os grupos vulneráveis. Para mitigar essas desigualdades, são boas soluções o ensino complementar, tutoria e atividades de aprendizagem extracurriculares e não formais.
A educação inclusiva torna a sociedade melhor
Políticas públicas voltadas às pessoas com deficiência sempre envolveram interseções entre as áreas da Educação e Saúde. Dessa vez, não será diferente, o que exige um olhar intersetorial e conciliador por parte de toda comunidade escolar.
É papel dos educadores garantir que ninguém seja excluído, desmotivado ou deixe de estudar. Da crise, pode sair a oportunidade necessária para que haja movimentação e pressão em prol da construção de uma sociedade baseada na equidade.